Visões poéticas na Hungria

Budapeste, O olhar inquisidor, Abril 2015

O momento não era, de todo, esperado. As viagens para Budapeste para esta altura, como verificámos uns meses atrás, estavam demasiado caras, situação que se manteve até perto da data de inauguração da exposição. Mas acaso do destino, uns dois dias antes surgiu um voo muito específico, a preço mais acessível, que permitiu a nossa ida e a preparação da surpresa que nos iria permitir estar presentes no evento. Praticamente ninguém sabia, nem soube, incluindo os membros da organização, até entrarmos na Biblioteca Nacional das Línguas Estrangeiras. A situação foi tão caricata que acabámos por viajar no voo inaugural do percurso Lisboa – Budapeste da companhia Húngara Wizz Air, facto que só soubemos na altura do check in, com direito posterior a champanhe, sumo e a um bolo em forma de réplica de um avião da companhia antes de embarcarmos.

Kápolnásnyék, Igreja Católica Romana, Abril 2015

O potencial de um projecto como o que origina esta exposição pode ser palpável na crença pessoal, em que acreditamos no que estamos a fazer, mas a sua realização plena só pode ser encontrada quando recebemos opiniões como as do passado dia 1 de Abril, quando estamos em contacto directo com o público a quem esta mostra se dirigia. E neste caso, por muito que esta exposição possa ser perfeitamente apreciada por qualquer audiência, afinal de contas isto só faz sentido se o fizermos também para os outros e não só para nós, o público-alvo principal eram os Húngaros.

Budapeste, Casa dos Elefantes - Zoo de Budapeste, Abril 2015

Como seria de esperar, a minha presença no evento deu azo a que tivesse de proferir algumas palavras sobre a exposição. O meu pouco à-vontade era visível, já que normalmente comunico por outras vias, mas senti que, com uma boa dose de prática futura, as coisas poderão melhorar substancialmente na vertente oral. Poderia ter falado horas sobre este projecto, mas felizmente decidi não me alongar muito. A ajuda de Bálint Urbán na tradução em tempo real das palavras que fui dizendo foi, mais uma vez, uma ajuda preciosa.



O cartaz, com o respectivo título em Húngaro que podia ser vislumbrado em diferentes partes da Biblioteca, era a primeira pista fundamental para esta mostra. Hungria: Uma visão poética. A memória descritiva, também em Húngaro, que se encontrava perto da entrada da sala, entre a biografia e os créditos, era outra. É aqui que se começavam a descortinar as linhas condutoras, os pequenos detalhes, os pormenores que nos levaram até aqui. E foi impressionante como os senti novamente mal aterrámos em Budapeste. O impulso era forte, apetecia-me fotografar tudo, com destaque para as pessoas mais idosas, com as suas faces características e roupas fantásticas, que podiam ser vistas na cidade em todo o seu esplendor, ou não tivéssemos apanhado um frio de rachar, com momentos de chuva e céu cinzento, nesta semana.

Budapeste, A mão e a folha, Abril 2015
O feedback foi realmente fantástico e muito produtivo.
O público presente dividia-se entre amigos, conhecidos e desconhecidos, mas todas as conversas fluíram, de forma impressionante diga-se e em comparação com outras experiências deste género em Portugal, para o conteúdo e nunca para a vertente técnica (máquinas, programas, pós-produção, etc.). Só isso foi desde logo positivo, mas nada me preparou para as reacções. Exposição em geral, a dificuldade que deve ter sido escolher apenas 24 fotografias, encontrar o equilíbrio, falarem-me dos momentos que me diziam que só eu os via, fotografias específicas, cujas favoritas variavam consoante as pessoas ou os minutos. Comentários sobre os textos, que eram bonitos e que desconheciam até então essa minha vertente. Noutras ocasiões disseram-me que isto era algo que nunca tinham visto, ainda mais de um estrangeiro sobre a Hungria, um olhar muito próprio, diferente e, pasme-se, positivo sobre o país. Que descrevia e mostrava várias facetas do país de uma forma pouco comum, poética, longe da abordagem habitual de conotações políticas ou da apresentação turística óbvia. O feedback foi realmente fantástico e muito produtivo.

Gárdony, Abril 2015

Várias pessoas sugeriram que esta exposição tem de viajar posteriormente para outras cidades e espaços, ou algo semelhante consoante o foco e por ter fotografias de vários locais da Hungria que só podiam estar presentes em número reduzido nesta exposição. Que tem de ser vista e lida, que há que editar um livro sobre este projecto e que irão escrever um artigo. Até uma pessoa, ligada a galerias e museus, passou o tempo a tirar notas e fotografias à exposição e comentou que nunca tinha visto nada assim, o que numa cidade que está sempre a receber exposições e espectáculos culturais de alto calibre, é motivo de um orgulho imenso e de muitos sorrisos. Nem sabia como reagir e o que dizer em inúmeros momentos confesso. Falou-se sobre o porquê de algumas das fotografias serem de pessoas idosas, de como os textos são pequenas histórias e de como formam a narrativa da exposição, de como isso não era normal de se ver numa exposição de fotografia, ou de como isso se conjugava com o não se apostar em impressões de grande formato e de como isso puxa a atenção das pessoas para as fotografias e textos quando se entra na sala, para os pormenores.

Budapeste, Monumento Imre Nagy, Abril 2015

O saldo deste nosso pequeno regresso à Hungria foi absolutamente positivo. Acontecer nesta altura foi simbólico por razões óbvias, mas não só da exposição se fizeram estes dias, pelo contrário. O convívio com amigos em Budapeste e com a nossa família adoptiva Húngara em Pázmánd foram pontos altos numa viagem e estadia curta, mas intensa, onde até as pessoas que trabalhavam no café situado perto da nossa antiga casa, ou no Burger King ao lado da Faculdade de Letras da Universidade ELTE, ainda se lembravam de nós, dos nossos pedidos (impressionante) e nos receberam com simpatia quando fizemos questão de os visitar.

Pázmánd, Abril 2015

Muito obrigado novamente ao José Reis Santos pela amizade, companhia, tertúlias e por nos ter ajudado com a estadia nestes dias, à Sónia, Judit, Dora, família Csurgó e Marton Rita, por nos acolherem em Pázmánd e na família, pelos sorrisos, amizade, ajuda e presença, ao João Miguel Henriques, leitor do Instituto Camões em Budapeste, pela aposta e apoio, ao Bálint por toda a ajuda na tradução de textos, palavras e companhia, à Márta Csaba e Eszter Fürth pelos momentos de convívio que souberam a pouco, ao Rafael e Péter pela simpatia, presença e apoio constante, à sempre adorável Sandy Badran que nos recebeu em êxtase, ao professor Ferenc Pál pelo apoio, amizade e palavras que trocámos, à professora Ildikó Szijj que se apaixonou pela fotografia do cão com o olhar mais querido do mundo, Gomi, à Evelin Hargitai e Daniela Neves, que estiveram connosco em espírito, a Ana Mojzer pela troca de impressões entusiástica sobre a exposição e vontade de ajudar a levá-la mais além e, claro está, à Biblioteca Nacional das Línguas Estrangeiras por acolher e apoiar esta exposição.

Budapeste, Os ninhos, Abril 2015

Nestes dias, apesar de ter sido difícil, controlei-me e tentei não tirar muitas fotografias ou focar-me demasiado nisso, mas como poderão observar ao longo deste artigo, com várias imagens novas, este projecto pessoal relacionado com a Hungria está longe de acabar. A exposição estará patente na Biblioteca Nacional das Línguas estrangeiras até ao dia 29 de Abril.

Budapeste, O olhar e o desafio, Abril 2015